Dá a surpresa de ser

Dá a surpresa de ser É alta, de um louro escuro. Faz bem só pensar em ver Seu corpo meio maduro.

Seus seios altos parecem (Se ela estivesse deitada) Dois montinhos que amanhecem Sem ter que haver madrugada.

E a mão do seu braço branco Assenta em palmo espalhado Sobre a saliência do flanco Do seu relevo tapado.

Apetece como um barco. Tem qualquer coisa de gomo. Meu Deus, quando é que eu embarco? Ó fome, quando é que eu como?

10-9-1930 - Poesias. Fernando Pessoa. (Nota explicativa de João Gaspar Simões e Luiz de Montalvor.) Lisboa: Ática, 1942 (15ª ed. 1995) - 123.

terça-feira, 29 de agosto de 2017

Fábula Amigos dos Animais


Uauauauauauau…

Elvis: Vê se te calas pá ! O que se passa, desde ontem que não me deixas dormir.

Black: Nem fazes ideia o que me aconteceu.

Elvis: Conta lá, sempre quero ouvir o que te anda a deixar desde ontem tão preocupado.

Black: O meu dono ontem foi a casa de uns amigos que têm uma cadela parecida comigo, loura… muita gira. Vivem num apartamento pequeno, não há espaço sequer para dar uma corrida. Ela confessou-me que anda com problemas nos músculos e nas articulações, porque coitadinha dorme num alcofa na cozinha, ao pé do frigorífico e não consegue fazer um pouco de ginástica, correr.

Elvis: E ela deu-te bola ?

Black: Bola ???

Elvis: Sim, bola !!! Não me digas que não sabes o que é isso. Interessou-se por ti !? Vai possibilitar chegaras-te a ela e haver qualquer coisa entre vocês, quando o teu dono voltar lá a casa dos amigos !?

Black: Não entrei nesses pormenores com ela. Soube que os donos lhe tinham feito uma operação para não poder ter filhos. Compreendes não é ?! O apartamento é pequeno. Eles têm um miúdo e a mulher está grávida e ainda a têm a ela.

Elvis: Puta que os pariu. Então tiraram-lhe o prazer de poder um dia vir a ter filhos e ser mãe ? Grandes cabrões !!! Mas pelos vistos, ficaste a gostar dela, entendi. Apaixonaste-te foi o que foi.

Black: Acho que sim. Gostava de a trazer para o pé de mim, mesmo sabendo que não pode ter filhos.

Elvis: Mas olha lá, tu sabes que nós não temos vontade própria. Mesmo que a queiras trazer para o pé de ti, não és tu que decides isso. Além disso, como é que fazes mostrar ao teu dono que gostas da… como é que ela se chama mesmo ?

Black: Simone !

Elvis: Como é que fazes o teu dono entender que gostas da Simone e queres que ela venha para ao pé de ti ? Estás a ver, não é !

Black: Tens razão. Esta vida de cão que levamos !!!

Elvis: Tenho sempre razão. Sabes uma coisa ? A minha dona anda muito estranha. Trata-me muito bem, mas agora obriga-me a lamber-lhe a mão. Põe um pouco de açúcar e depois manda-me lamber. “Elvis lambe !” diz ela. Todos os dias é isto pelas 9 horas da noite.

Black: Acho que ela vai começar pela mão e depois prepara-te. Eu outro dia bem vi, o meu dono alugou para aí uns filmes esquisitos de pessoas e animais. Eu acho que os seres humanos têm comportamentos muito aberrantes. Não lhes chega terem-se uns aos outros, homens e mulheres. A sociedade deles está mesmo decadente.

“Black ! Black !....”

Black: Olha o meu dono está a chamar-me para ir à rua. Estou aflito desde as 5:00 da manhã. Aqui enfiado nesta varanda onde mal me posso mexer.

Elvis: E eu ?! Bolas ! Ontem acabei por urinar aqui. Se a tua varanda é pequena, imagina a minha. Com a tralha toda do estendal e dos vasos com as plantas. Olha vinguei-me naquela planta ali. Levantei a perna e cá vai disto. Acho que vai morrer. Ehehehehe !!
Olha lá, antes de te ires embora. O teu dono quando vais à rua leva um saco plástico para apanhar a merda que tu fazes ?

Black: Qual quê !? Vai para o outro lado do bairro para eu defecar à vontade junto aos prédios amarelos. Sabes quais são ?! Os passeios andam todos cagados, mas pelos vistos ninguém se importa. Nunca nos ensinaram ou arranjaram, como eles têm, as sanitas, ou lá o que é ! Acho que até saiu uma lei a obrigá-los a apanhar a nossa caca, aquela que fazemos na rua e nos passeios, mas como sabes a fiscalização em Portugal levanta-se tarde

Elvis: Mas olha podia ser pior. Se fossemos gatos castravam-nos logo ! Afinal ainda temos donos nossos amigos.

“Black !... então, já te chamei duas vezes !

Black: Bem até logo. Vou arrear o calhau. Ehehehehe !!!!

20 comentários:

  1. : )))

    Uma conversa de cão muito séria!!

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    1. Pois não tenhas dúvidas Catarina ! Sabemos nós se eles conversam sobre isto ?!?!?!
      Será ???
      Obrigado

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  2. Com donos assim, é mesmo "vida de cão".

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    1. Pois, tens toda a razão ! É preciso espaço e nós nem sempre lhos damos.
      Obrigado Luísa

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  3. Muito interessante.
    Mas se um pessoa não esteriliza o cão ou o gato, está lixada.
    Beijinho

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    1. Maria sem querer entrar em polémicas. Será que temos o direito de o fazer ?!
      Obrigado

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  4. A vida de cão afinal até tem uma certa piada :)))
    Aquele abraço

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  5. Tenho que louvar a tua imaginação porque construiste uma história bem engraçada :) por outro lado chego à conclusão que há vidas de gente que têm vidas de cão.

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    1. Eu gosto de escrever, como alguns sabem e outros já perceberam !
      É verdade... e há cães que são mais considerados que seres humanos !
      Obrigado Manuela

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  6. bom dia
    esta dá muito para refletir .
    JAFR

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    1. Sim dá que pensar, mas penso que é só uma questão de nos pormos na pele de um animal, e se gostávamos que nos fizessem o mesmo !
      Obrigado Roaquim Rosa

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  7. (ainda não consegui parar de rir...)

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    1. O intuito é rir sim, mas também entender os animais. A fábula até está razoável, acho !
      Obrigado Afrodite

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  8. ahahah... Uma fábula "doce" qb, mesmo com cagadelas pelo meio ! ... Olha como eles entendem e se entendem ! :)
    E ... "Quem não tem cão, caça com gato" ! :))

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    1. É uma verdade Rui. Os animais se calhar, como disse à Catarina, falarão sobre estas coisas ?! Será ???
      Obrigado e Abraço Rui

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  9. tanta vez meu filho pediu um cão quando era pequeno. E nunca o teve porque não seria capaz de ter um cão numa varanda.
    Abraço

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    1. Pois Elvira, sempre tive em consideração que os animais precisam de espaço. E se um gato cabe dentro de apartamento, um cão "decente" já não !
      Obrigado

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  10. Conclusão:... ( e perdoa-me a sinceridade, Ricardo)
    ...sem a mínima vontade de rir; a vida de cão também tem laivos de sordidez, escravidão, falta de respeito e incumprimento pelos seus direitos.
    Na escala que rege os comportamentos, o ser humano consegue ficar "abaixo de cão"! :(

    PS- esta é a minha opinião sobre a história, independentemente da qualidade da escrita.

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    1. Janita perfilho da tua opinião. Nós gostamos de ter animais, mas nem sempre sei se gostamos deles, por aquilo que muitas vezes os fazemos passar !
      Obrigado

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Eu fiz um Pacto com a minha língua, o Português, língua de Camões, de Pessoa e de Saramago. Respeito pelo Português (Brasil), mas em desrespeito total pelo Acordo Ortográfico de 90 !!!