Dá a surpresa de ser

Dá a surpresa de ser É alta, de um louro escuro. Faz bem só pensar em ver Seu corpo meio maduro.

Seus seios altos parecem (Se ela estivesse deitada) Dois montinhos que amanhecem Sem ter que haver madrugada.

E a mão do seu braço branco Assenta em palmo espalhado Sobre a saliência do flanco Do seu relevo tapado.

Apetece como um barco. Tem qualquer coisa de gomo. Meu Deus, quando é que eu embarco? Ó fome, quando é que eu como?

10-9-1930 - Poesias. Fernando Pessoa. (Nota explicativa de João Gaspar Simões e Luiz de Montalvor.) Lisboa: Ática, 1942 (15ª ed. 1995) - 123.

sábado, 23 de julho de 2016

O Barbeiro de Sevilha de Giachinno Rossini


Mais uma célebre Ópera, obrigatória conhecer.

A escolha erudita desta vez, recai sobre a ópera de Gioacchino Rossini, “O Barbeiro de Sevilha”.

Resumo da história desta Ópera

Antecedentes

Em 1809 o magnate Domenico Barbaia assumiu a direcção do Teatro de São Carlos de Nápoles, sendo o principal responsável pelo prestígio conseguido por aquela sala de espectáculos que se tornaria a mais reputada em toda a Europa. O Teatro de São Carlos de Nápoles sempre tivera uma programação de carácter conservador. Foi assim que a vinda de Gioacchino Rossini, em 1815, iria ser uma lufada de ar fresco. Essa vinda do compositor, então com 24 anos, ficou a dever-se precisamente a Domenico Barbaia. Para o Teatro de São Carlos de Nápoles, Rossini escreveu, entre 1815 e 1822, 9 óperas dum total de 18. As outras 9 destinaram-se a outros teatros, já que o contrato assim o permitia. Entre estas 18 óperas escritas em Nápoles conta-se um dos maiores, se não o maior, sucesso do compositor. Estamos a falar de "O Barbeiro de Sevilha". O libreto é de Sterbini que se baseou numa comédia homónima de Beaumarchais. A estreia teve lugar em Roma em 1816.

1º. Acto

A acção passa-se em Sevilha e a ópera inicia-se numa rua em frente da casa de Don Bartolo, que tem a tutela da muito rica Rosina com quem, por isso mesmo, pretende casar, apesar da grande diferença de idades. É junto das janelas dessa casa que o Conde de Almaviva canta uma serenata à dita Rosina, quando aparece o barbeiro Figaro a quem o Conde facilmente suborna para o ajudar a chegar junto da sua amada. E Figaro elabora um plano astucioso: o Conde entrará em casa de Don Bartolo sob o disfarce de Lindoro, um oficial acabado de chegar à cidade, que, para facilitar as coisas, deverá fingir estar completamente embriagado.
O 2º. quadro passa-se no interior da casa de Don Bartolo onde Rosina confessa a Figaro estar apaixonada por um jovem que lhe fizera uma serenata, e que ela julga chamar-se Lindoro. É assim que entrega ao barbeiro uma carta que este deverá fazer chegar ao jovem. Chega Don Bartolo, e Figaro esconde-se. E é do esconderijo que escuta uma conversa entre Don Bartolo e Don Basilio, o mestre de música, durante a qual os dois velhos combinam difamar o Conde de Almaviva, e assim apressar o casamento do tutor com a sua pupila. Figaro revela o que ouviu a Rosina e, juntos, discutem o que fazer em semelhante conjuntura. Don Bartolo regressa e pretende saber o que se passa, mas Rosina consegue disfarçar. É então que surge o Conde disfarçado de oficial e fingido estar completamente embriagado, ao mesmo tempo que apresenta a Don Bartolo o título de aboletamento (alojar; aquartelar) em sua casa. Este fica assustadíssimo e quer desfazer-se do intruso alegando estar dispensado dum tal dever. Então o Conde desembainha a espada, e aproveita a confusão que esse gesto provoca para passar um bilhetinho a Rosina. Alertados pelo barulho chegam o barbeiro e Don Basilio, seguidos duma patrulha que quer levar o pretenso oficial sob prisão. Só não o fazem porque o fidalgo revela, em segredo, ao Comandante, a sua verdadeira identidade. Don Bartolo e Don Basilio ficam consternados.

2º. Acto

Este passa-se também em casa de Don Bartolo onde o Conde de Almaviva tenta um novo disfarce para se aproximar de Rosina. Desta vez é um professor de música que vem substituir Don Basilio, pretensamente doente. Para acalmar as suspeitas de Don Bartolo, o falso professor mostra-lhe uma carta escrita por Rosina, alegando tê-la obtido junto duma das amantes do Conde. A lição de música começa, sendo interrompida primeiro por Figaro, que se apresenta para barbear Don Bartolo, depois por Don Basilio que, conquistado pelo dinheiro, se finge doente. Entretanto Almaviva e Rosina planeiam a fuga, mas Don Bartolo desconfia e decide não adiar mais o casamento com a pupila. Desgostosa com as calúnias acerca do seu amado, Rosina aceita casar com o velho tutor, que manda Don Basilio a casa do Notário para preparar o contracto. Despeitosa, Rosina denuncia mesmo o plano de fuga, o que leva Don Bartolo a sair para ir buscar a polícia. Surge uma tempestade, durante a qual o Barbeiro e o Conde aproveitam para entrar por uma janela. Almaviva revela a sua verdadeira identidade a Rosina e os dois renovam as suas juras de amor preparando-se para fugir. Entretanto aparece Don Basilio com o Notário. O casamento realiza-se, não entre o tutor e a pupila mas entre Rosina e o Conde. As testemunhas são o Barbeiro e Don Basilio. Quando Don Bartolo chega com a polícia já é tarde. Resta-lhe resignar-se – o que não é assim tão difícil já que Almaviva renuncia ao dote de Rosina.

Personagens de O Barbeiro de Sevilha

O Conde de Almaviva ………………………………….Tenor
D. Bártolo, médico tutor de …………………………….Baixo “Buffo”
Rosina, rica pupila que mora com D. Bártolo………...Soprano Ligeiro
Fígaro, barbeiro …………………………………………Barítono  
D. Basílio, mestre de música de Rosina, hipócrita…  Baixo
Fiorello, criado de Almaviva ……………………………Tenor
Berta, velha criada de D. Bártolo ……………………...Soprano

Um oficial, um alcaide, um tabelião, alvazis, soldados tocadores de instrumentos


Do autor Gioacchino Rossini, … (excertos)

Filho de uma cantora de fracos dotes vocais, Ana Guadarini e de Giuseppe Rossini, trompetista de modestas possibilidades. Os seus pais levaram vida de feirantes, ele a tocar nas orquestras de teatrinhos de província e ela a pisar os palcos no desempenho de segundas-partes, até que o seu pai decidiu empregar-se como pregoeiro e trombeta do município de Pesaro, cidade e porto de mar no Adriático, não longe da microscópica República de São Marino. É nesta altura que nasce Gioacchino Rossini, em Pesaro, 29 de Fevereiro de 1792. Aos 12 anos, já mostra inequívoca vocação para a música. Foi um egresso (alguém que deixou a vida religiosa; ex-frade; aquele que saiu) franciscano que o iniciou nos primeiros segredos da Arte em que viria a pontificar.
Dotado de linda voz de soprano, começou a cantar nas igrejas, e como seu físico fosse esbelto, seus pais entraram de alimentar grandes esperanças de que, após a crise da puberdade, deviesse um tenor de primeira ordem.
A 20 de Março de 1807, com 15 anos, entrou para o Liceu Musical de Bolonha, onde estudou contraponto e completou a educação artística com o celebérrimo Padre Estanislau Mattei (1750-1825).
Não tardou em fazer os primeiros ensaios de composição com êxito. Seu primeiro triunfo alcançou-o com a farsa “La cambiale di matrimónio” cantada em 3 de Novembro de 1810, no Teatro de S. Moisés, de Veneza, Tinha quase 19 anos e com essa idade o seu saber gozava de tal reputação que o escolheram para dirigir a execução de “As Estações”, do grande José Haydn (1732-1809).
Em virtude do espaço de que podemos dispor, renunciamos a dar uma ideia, por pálida que seja, do que foi a gloriosa carreira deste músico insigne a quem ficámos devendo, além de “O Barbeiro de Sevilha”, partituras como “A Italiana em Argel” (1813), Otelo (1816), “A Gata Borralheira” (La Cenerêntola) (1817), “A Pega Ladra” (1817), “Semiramis” (1823) e, especialmente, “Guilherme Tell” (1829), depois da qual não voltou a escrever por se ter convencido que a arte de cantar entrara em decadência irremediável, isto quando o mundo pasmava ouvir as “Marchisios”, a “Albioni”, a “Patti” e o “Mongini” ! E nessa convicção viveu ainda quase 40 anos, até falecer em Ruelle, nos arredores de Paris, a 13 de Novembro de 1868.

Texto extraído e adaptado de:
Colecção "Ópera", Volume 17, Direcção Mário de Sampayo Ribeiro, Editor Manuel B. Calarrão, Lisboa, Dezembro de 1947, Preço 4$00.

DVD indicativo: Na Amazon francesa existem vários com diversos cantores, escolhi este.

Trechos Musicais

Abertura de “O Barbeiro de Sevilha”, Orquestra Filarmónica de Berlim dirigida por Claudio Abbado.


1º. Acto
Ecco, Ridente in Cielo - Alfredo Kraus, Conde de Almaviva (tenor)


Largo al factotum - John Rawnsley, Figaro (barítono)


Una voce poco fa - Cecília Bartoli, Rosina (soprano)


La calumnia é un venticello - John Relyea, D. Basilio, John del Carlo, D. Bartolo, (ambos baixos)


2º. Acto
Di se felice innesto (Final da Ópera) com Rosina, Teresa Berganza; Conde Almaviva: Luigi Alva; Fígaro: Hermann Prey; D. Bártolo: Enzo Dara; D. Basílio: Paolo Montarsolo; Berta: Stefania Malagù; Fiorello: Renato Cesari; Orquestra e Coro do Teatro Scala de Milão; Maestro: Claudio Abbado; Direcção: Jean-Pierre Ponnelle)

17 comentários:

  1. Ricardo, já retive o prazer de a ver toda.
    Dou-lhe os parabéns por este "documentário" tão bem estruturado.

    Um beijinho e bom fim de semana

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    1. Era muito difícil, qause impossível, viver a minha vida sem música.
      Esta a segunda publicação sobre Óperas. A primeira foi "La Bohéme" que infelizmente, já tem dois videos cortados. Podes ver aqui:
      https://opactoportugues.blogspot.pt/2015/02/la-boheme-de-giacomo-puccini.html
      Obrigado Fê

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  2. Dizem os entendidos- entre os quais te incluo, Ricardo, apesar de nunca to ouvir dizer - que a Ópera é o casamento entre o teatro e a música.
    Acredito que seja mesmo assim já que, no fundo, se trata de teatro cantado.

    Ao vivo, nunca assisti a nenhuma peça de Ópera, mas em tempos, a única estação de televisão que tivemos durante muitos anos, passava muito teatro e havia uma rubrica intitulada 'Noite de Ópera' .
    O «Barbeiro de Sevilha» e «Otelo», são duas peças que me recordo bem de ver.

    Esta tua apresentação da história, tão completa e bem estruturada, é digna de ser lida e entendida, antes de se verem os vídeos.
    Parabenizo-te por este excelente post.


    Se me permites, lembrei-me de uma piada que corria aquando as Noites de Ópera televisiva.
    Dizia-se que se podia ver "ópera por dez tostões". Importância que se pagava de taxa de televisão. (dez tostões por dia, pagáveis mensalmente).

    Um abraço, bom fim-de-semana, Ricardo.

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    1. A Ópera é o casamento enter o teatro e a música. A definição pode ser aplicada sim. Deram algum trabalho estas publicações sobre ópera. Primeiro a recoha dos textos e depois a escolha dos excertos musiciais e árias mais conhecidos.
      Mas compensou o trabalho, quando se quer mostrar algo diferente do habitual.
      Obrigado Janita

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  3. Já tive oportunidade de ver esta e La Bohéme em Óbidos e ao livre. Espectáculos fascinantes que me encheram a alma.

    Obrigada pela partilha Ricardo

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    1. Desde que não haja vento e o local de actuação seja estilo anfi-teatro, é agradável ver espectáculos musicais ao vivo. Continuo a preferir um teatro ou um recinto próprio para, mas ao ar livre, às vezes corre bem !
      Obrigado Manuela

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  4. Cinco estrelas!!
    Aquele abraço, boa semana

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    1. Talvez uma das mais conhecidas óperas e uma das mais conhecidas aberturas de ópera !
      Obrigado e Abraço Pedro

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  5. A história é muito gira :)
    Já tentei ouvir ópera no canal Mezzo, mas acabo por desistir...
    Boa semana!

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    1. M. acredita em mim. Os espectáculos têm de se ver no seu ambiente natural, e a ópera não é diferente. No entanto, o bom gosto impera nas pessoas que vêem e ouvem o canal fgrancês "Mezzo" !
      Obrigado

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  6. Ricardo, esta é uma das óperas que mais gosto e agora com a tua excelente explicação percebi muita coisa que me tinha "faltado" quando a vi na televisão.
    Também gostei de saber sobre a vida de Rossini,tão jovem e tão talentoso.
    Obrigada uma vez mais por esta partilha.

    Um beijinho

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    1. Mas esqueci-me o motivo porque vim uma vez mais aqui :) despedir-me até Setembro , as férias e o dever chamam-me :D

      Um beijinho e tudo de bom por aí!

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    2. É muito elogio da tua parte. Dar a conhecer com algum propriedade e conhecimento, é sempre algo que faço com muito prazer !!!
      Fê, obrigado e Boas Férias

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  7. Confesso que me sinto um bom bocado ignorante no que toca a ópera. Vi poucas na minha vida: algumas que vieram aqui até Leiria. Mas conheço trechos, melodias absolutamente encantadores!

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    1. O Teatro de Leiria, José Lúcio da Silva, tinha sempre muitos bons programas. Cheguei a ver concerto de câmara por lá, em 1975, quando frequentei o antigo quartel no Castelo, durante a especialidade. Uma cidade com um nível cultural muito interessante. Gostei e gosto muito de Leiria.
      Obrigado Graça

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Eu fiz um Pacto com a minha língua, o Português, língua de Camões, de Pessoa e de Saramago. Respeito pelo Português (Brasil), mas em desrespeito total pelo Acordo Ortográfico de 90 !!!